Camaradas, desenvolvi essa análise sobre a questão da corrupção no campo da esquerda. Reproduzo aqui para o debate. Fiquem à vontade para concordar ou discordar e críticas são bem-vindas. O importante é fomentar o debate.


Muito se fala hoje que o debate sobre corrupção está sendo capturado e hegemonizado pela direita, e a esquerda está perdendo terreno nesse espaço. Fala-se até dentro de certas esquerdas que esse debate deve ser abandonado, pois é puramente moralista. Afinal, isso está correto?

O que é a corrupção? Eu caracterizaria a corrupção como uma relação criminosa que existe entre o estado burguês e a iniciativa privada. Numa ação de corrupção, existem dois agentes: o corrupto e o corruptor. Devemos lembrar que vivemos numa sociedade burguesa, onde aqueles que detém os meios de produção são aqueles que detém o poder. Logo, já conseguimos identificar aí quem é o corruptor: a iniciativa privada. O estado burguês pode ser entendido como o “balcão de negócios” da burguesia. Seus representantes (vereadores, deputados, senadores, presidente, etc.) estão lá para fazer com que os negócios dessa classe dominante prosperem, através da cada vez mais profunda super exploração dos trabalhadores, passando todo o tipo de projeto que vai ajudar a sugar mais-valia deles e outros projetos que vão fortalecer a defesa da propriedade privada e a sua acumulação de riqueza. Nesse momento, a burguesia se dispõe daquilo que representa seu poder: capital. Parte desse capital é utilizado para comprar (leia-se corromper) esses representantes do estado burguês, justamente para que eles defendam seus interesses. Logo, conseguimos identificar os corruptos: os representantes do estado burguês, em resumo, os “políticos”. [1]

A partir daí, já conseguimos perceber uma falha enorme nessa chamada “democracia representativa” em que vivemos: quando votamos nos “nossos” representantes, na verdade, o nosso voto não vale praticamente de nada. Caso votemos em um candidato e ele seja eleito, o que geralmente vai acontecer é que esse representante não vai atender aos interesses meus e de quem mais votou nele, e sim aos interesses do burguês que financiou a sua campanha e construiu a sua imagem, em troca de projetos de lei que irão o favorecer, ou seja, aos interesses do burguês que o corrompeu. Lógico que existem as exceções, existem candidaturas que estão realmente querendo levar a luta dos trabalhadores para dentro do parlamento burguês (que fique claro também que só isso não basta, mas isso é assunto pra outro post). Mas as exceções só servem para confirmar a regra: dentro desse modus operandi do capitalismo, a corrupção cumpre um papel fundamental na sua reprodução e na sua manutenção.

Então, fiquem de olho em qualquer candidato que fica prometendo acabar com a corrupção, pois, a partir da análise feita, se percebe que é impossível acabar com ela por dentro da ordem, já que a ordem se beneficia dela. Se o candidato pauta o fim da corrupção sem pautar o fim do capitalismo, dizendo de uma forma bem objetiva, ele está sendo um demagogo e um enganador, mesmo que ele não tenha consciência disso.

MAS, E A QUESTÃO MORAL? A questão da corrupção PODE OU NÃO ser utilizada de uma forma moralista. A minha análise parte do pressuposto de que a corrupção no capitalismo é estrutural e serve à própria reprodução e manutenção do sistema. Essa seria uma forma não moralista de encarar essa questão. Agora, quando eu digo que um candidato, seja da direita ou da esquerda, é corrupto, eu estou me apegando apenas à um discurso moral, como se simplesmente esse candidato tivesse um problema de desvio de caráter, e não fosse um produto de uma estrutura que, provavelmente, o forçou a ser assim para ter mais ou menos “igualdade” dentro do jogo democrático burguês. Quando há uso de capital dentro do processo político é quando o cargo político se torna mais uma carreira do que um modo de satisfazer as necessidades humanas. Logo, dentro do estado burguês, sobrevive aquele que consegue ter mais capilaridade entre a burguesia. É por isso que os políticos vulgares, quando querem serem eleitos, apontam muito mais os seus discursos em projetos que vão deixar a burguesia ouriçada, como as privatizações e reformas nas leis de trabalho e aposentadoria, por exemplo, do que projetos que vão satisfazer as necessidades e demandas dos trabalhadores. Esses políticos fazem isso porque eles sabem muito bem quem é que manda no processo.

Portanto, a esquerda DEVE sim criticar a corrupção. Mas fugindo do discurso puramente moralista e adotando um discurso que abarca a totalidade do sistema capitalista. O problema da corrupção não está num Lula ou num Bolsonaro, num Ciro Gomes ou num João Amoedo. O problema da corrupção está nas entranhas do sistema capitalista, que dela se beneficia para sobreviver. Devemos, por exemplo, criticar o Bolsonaro pela sua inegável corrupção, mas sempre demonstrando que ele é produto de forças muito maiores.

E claro, não preciso nem falar aqui que, para superar definitivamente a corrupção, devemos lutar para superar o capitalismo e construir um governo dos trabalhadores, com novos alicerces sólidos que sirvam para defender os interesses da maioria contra a mesquinhagem das minorias. Lutar contra a corrupção é lutar também pelo SOCIALISMO! Avante!!!

[1] Importante lembrar que política não se resume só aos “políticos”. Eu coloco esse termo entre aspas justamente pra mostrar isso. Em suma, todos nós somos seres políticos. Independente de você ser ou não um militante, a sua vida está regida por processos, e claro, também por interesses políticos. A questão é que a luta pelo socialismo também diz respeito ao poder dos trabalhadores sobre os processos políticos, que atualmente são controlados pela burguesia.

  • Camarada ForteMA
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    13 years ago

    Muito bem colocado, camarada. A corrupção é apenas o sintoma de um problema estrutural, que é o capitalismo. A iniciativa privada raramente tem prejuízos por bancar os agentes de seus interesses, mesmo que fora da própria lei burguesa. Traduzir a corrupção como fenômeno associado ao capitalismo é uma forma de abordar esse debate sob uma perspectiva radical